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Selinhos

quinta-feira, 28 de abril de 2011

Simplesmente Imprevisível - Um relato de infância

     Era primavera de 2004, a poucos dias tinha sido meu aniversário de oito anos e eu estava na segunda série. Me lembro muito bem daquela semana... Tudo parecia normal, nada além de uma semana ordinária. Como toda segunda-feira eu havia acordado de mu humor e com preguiça, mas assim que chegava na escola minhas amigas Mariana, Rayssa, Maíra e Luiza me animavam.
     O assunto da semana era o novo óculos da Luiza que ela iria buscar na terça-feira. Ela o descrevia enquanto conversávamos, dizia que ele era roxo , retangular e  lembro que ela mencionou que os óculos eram da Kipling.
     E assim a semana foi passando. Segunda-feira saímos todas juntas para brincar, terça-feira enquanto a Luiza buscava seu óculos, eu, a Mari e a Rayssa  fomos para aula de desenho e como na época nossa sala estava em reforma sempre tínhamos aula em lugares diferentes. Era divertido. Como sempre cheguei em casa e vi um programa na televisão, até que minha mãe me mandou ir dormir. Como toda criança eu reclamei, gritei e esperneei, mas acabei indo dormir, sem saber a trágica notícia que me aguardava.
     Era quarta-feira. Meus pais entraram bruscamente no quarto para me acordar. Havia algo errado. Minha mãe estava com uma cara apreensiva e segurava um jornal nas mãos, então ela olhou seriamente  para mim e disse:
     - Filha, sabe a Luiza? Ontem ela estava andando de carro e ele bateu... A mãe e o irmão dela morreram e ela... Ela esta na UTI - Assim que ela acabou de falar meu rosto era um misto de terror e confusão. - Então... Se você não quiser ir à escola hoje... Tudo bem. - Ela completou.
     Eu não queria ir à escola, não mesmo. Mas eu não podia deixar mina mãe preocupada comigo, enquanto   uma amiga precisava do nosso apoio, eu queria ser forte.
     - Não mãe, - Eu disse - vou para escola. - Então, eu comecei a me arrumar para ir.
     Assim que cheguei na escola e a aula começou  todos fomos até a quadra coberta, desde o infantil, até o último ano do ensino médio. A dona Sônia falou algumas coisas em homenagem aos mortos e todos lhes dedicamos um momento de silêncio.
     Os rumores na escola não paravam. Alguns diziam que a Luiza já havia morrido , outros que ela havia perdido a metade direita do cérebro e estava sendo mantida viva através de máquinas, e estava fadada à morte. Eu não acreditava. Eu não QUERIA acreditar, afinal, não podia ser verdade, como em um dia uma pessoa pode estar super bem e animada e no outro estar praticamente morta?Eu achava impossível.
     As semanas se passavam... Uma, duas, três...Sem notícias de melhoras, até que na quarta semana algo mudou. Para pior. 
     Eu não lembro que dia da semana era, só me lembro que nossas duas primeiras aulas eram Português e eu estava conversando com a Maíra, notamos que a Rayssa ainda não havia chegado. Era um dia chuvoso. Eu nunca esquecerei, porque aquela goteira na frente da nossa sala tornava  o clima sombrio para notícia que vinha a seguir.
     Uma aula passou e a Rayssa chegou. Ela estava com cara de luto e carregava um guarda-chuva nas mãos. Ela entrou e sentou ao meu lado, então perguntei:
     - Por que você chegou atrasada?
     - Eu fui ao funeral  da Luiza - Ela disse. Eu fiquei pasma, e eu pensava, que finalmente, tudo estava  melhorando. Eu fiquei em estado de choque.
      Os dias se passaram e o pai de Luiza chamou a mim e a Rayssa para perguntar se queríamos algum brinquedo da Lu, mas não queríamos nada, a não ser a próprica Luiza.
     Anos se passaram e o pai da Lu se mudou e de acordo com os boatos casou-se novamente.
     A lembrança da morte da Luiza Gardel acabou tornando-se apenas uma recordação passageira e alguns dias atrás esse assunto reapareceu enquanto eu conversava com a Mariana sobre um projeto de texto  que a nossa professora de português pediu em forma de relato pessoal sobre um fato marcante de nossa infância, então decidi que seria sobre isso que eu escreveria.
                                                                                                                      Por Ana Letícia A. Cajazeira

3 comentários:

  1. Caraca. Minha amiga, você escreve muito bem. Por que parou de postar por aqui? O teu blog é lindo. Consegui ver tudo, cada cena. E inevitavelmente chorei. Não é tão fácil que isso ocorra quando leio, porque leio muito, então, vou me acostumando a certos relatos, mas esse, especialmente, me fez chorar. Muito triste, e é incrível o quanto isso te marcou, você lembra de cada detalhe. Volta pra cá, vamos movimentar esse blog? Vamos divulgar? Eu me encarrego. O que achas de postar novamente? Te cuida. Eu voltarei aqui sempre que houver uma nova postagem.
    Beijos mil,
    Dé.

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  2. Oi Ana!
    Lindo e trite relato!
    Certamente para uma criança vivenciar uma tragédia dessas não foi fácil, absorver a efemeridade da vida, noooossa. Senti cada passo da narrativa. Você escreve muito bem!

    Beijo!

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  3. Brigada genti! E deb já pode ir divulgando que eu vou continuar escrevendo volta e meia ;)

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